Estudo. China tem oportunidade para reforçar papel internacional do yuan

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A China pode aumentar o papel internacional do yuan, segundo um estudo elaborado pela Universidade Renmin, apesar da ausência de convertibilidade da moeda chinesa e rígido controlo imposto por Pequim sobre o fluxo de capital.

Argentina, Brasil e Rússia incrementaram já o uso do yuan nas trocas comerciais com a China, numa altura em que o debate sobre a fragmentação do mercado monetário e a diluição do domínio do dólar norte-americano foi renovado pelas sanções impostas pelo Ocidente contra a Rússia.

O estudo da Universidade Renmin, que mede a “internacionalização” da moeda, com base no seu uso no comércio internacional, reservas e transacções cambiais, conclui que o yuan teve uma pontuação de apenas 6,4, numa escala de 0 a 100, no ano passado.

Embora este tenha sido o valor mais alto do yuan até à data, ficou bem atrás do dólar e do euro, que obtiveram 50,5 e 25,16 pontos, respectivamente.

O estudo apontou que a China deve pressionar por mais acordos de livre comércio, bilaterais ou regionais, para aumentar as oportunidades de comércio e investimento e criar condições favoráveis para o uso do yuan no exterior.

“Também devemos fortalecer os intercâmbios com países desenvolvidos no âmbito da transformação do modelo económico para baixar as emissões de carbono e no desenvolvimento financeiro verde, e aproveitar o potencial do yuan para servir a cooperação no combate contra as alterações climáticas e o desenvolvimento de baixo carbono”, lê-se.

O mesmo documento sugeriu: “A China deve participar activamente na formulação das futuras regras de comércio digital e na governação económica digital global, e aproveitar ao máximo as vantagens na transformação digital e no desenvolvimento da moeda digital do banco central”.

A China tem tentado internacionalizar a sua moeda, o yuan, desde 2009, visando reduzir a dependência do dólar em acordos comerciais e de investimento e desafiar o papel da divisa norte-americana como a principal moeda de reserva do mundo.

O dólar é utilizado em 84,3% das trocas comerciais a nível global, segundo dados recentes divulgados pelo jornal britânico Financial Times. Mas a participação do yuan mais do que duplicou desde a invasão da Ucrânia, de menos de 2% para 4,5%, reflectindo o maior uso da moeda chinesa no comércio com a Rússia.

Num ensaio académico, Michael Pettis, professor de teoria financeira na Faculdade de Gestão Guanghua, da Universidade de Pequim, explicou como a “rigidez” do sistema financeiro da China, em contraste com o mercado de capitais aberto dos Estados Unidos, impede o yuan de assumir maior predominância como moeda de reserva.

Pettis lembrou que o mundo continua a usar o dólar devido à “profundidade, flexibilidade” e “governação superior” do mercado financeiro norte-americano, e à “disposição e capacidade dos EUA de acomodar e absorver os desequilíbrios” comerciais do resto do mundo, incorrendo em grandes ‘deficits’ comerciais.

“A economia e o sistema financeiro dos EUA absorvem quase metade das poupanças do mundo”, apontou Pettis. O mercado aberto de acções e títulos de dívida do país desempenha também um papel central no financiamento das empresas, famílias e governos.

A China, por outro lado, tem um sector financeiro “mais rígido”, com o crédito bancário a servir directamente os objectivos do Estado e a alocação de crédito a ser determinada pela liderança política.

O sistema financeiro e os activos chineses estão, assim, praticamente vedados ao capital estrangeiro, e o yuan não é inteiramente convertível. O banco central chinês estabelece diariamente uma taxa de paridade para o valor do yuan, em relação ao dólar norte-americano. A moeda chinesa pode oscilar até 2% face a essa taxa de referência.

No evento que marcou a publicação do estudo da Renmin, Chen Yulu, ex-vice-presidente do banco central e agora presidente da Universidade Nankai, disse que o yuan é já a terceira maior moeda internacional, superado apenas pelo dólar e euro, e que a sua participação no mercado e influência estão a crescer.

“Para transformar o yuan numa moeda equivalente ao dólar norte-americano e ao euro, até 2035, são necessárias três condições: um sistema industrial moderno apoiado pela economia real, o aprofundamento do mercado financeiro doméstico e grandes progressos na infraestrutura de internacionalização do yuan e um equilíbrio de alto nível entre a abertura institucional do sistema financeiro da China e o regime de controlo de risco”, apontou Chen.

Num relatório divulgado no início deste mês, a Associação Bancária da China chamou os bancos estatais e os gigantes industriais a desempenhar um papel de liderança, priorizando o uso da moeda chinesa no comércio de matérias-primas e em projectos no exterior.

“Dado o ajuste no sistema monetário internacional após a pandemia e o conflito Rússia – Ucrânia, a internacionalização do yuan tem uma importante janela para se desenvolver”, lê-se no relatório.

“Os bancos chineses devem aproveitar a oportunidade histórica”, acrescentou.

Lusa, 24/07/2023