Tema sensível continua em cima da mesa do Governo e estão previstos novos aumentos nos próximos dois anos. A subida do gasóleo preocupa os agentes económicos e os especialistas, que alertam para a forma como o processo deve ser conduzido.
Devido aos subsídios públicos, o preço dos combustíveis em Angola, sobretudo da gasolina e do gasóleo, continua a ser dos mais baixos do mundo. Mas, de acordo com os cálculos do Expansão, se o preço final ao consumidor fosse calculado em função dos preços de mercado, a gasolina custaria 732 Kz esta semana, enquanto o gasóleo estaria a ser comercializado a 1.013 Kz por litro, mais de seis vezes acima dos 160 Kz por litro praticados desde Janeiro de 2016. Em 2022, os subsídios aos combustíveis representavam 18,9% da despesa fiscal primária, 3,7% do PIB e ascendiam a 1,99 biliões Kz.
Caso o Governo prossiga com a retirada dos subsídios aos combustíveis, como está previsto na proposta de Orçamento Geral do Estado (OGE) para o próximo ano, os objectivos de estabilização da inflação e de outros fundamentos macroeconómicos podem ser colocados em causa, sobretudo quando associados a uma tendência de desvalorização do Kwanza e de fraco crescimento económico. A reforma dos subsídios deve ser concluída até ao fim de 2025.
As contas do Expansão são efectuadas a partir dos preços de referência nas refinarias fora do País, tanto para a gasolina como para o gasóleo, com a adição das margens de logística (30%), distribuição (10%) e comercialização (15%). Em Angola, o preço do litro da gasolina foi actualizado no dia 2 de Junho – passou de 185 Kz para 300 Kz por litro – mas o preço do gasóleo não é alterado desde Janeiro de 2016.
“A minha primeira preocupação está mesmo no preço do gasóleo, porque este produto toca em muito mais coisas na economia. Não se pode mudar o preço do gasóleo da mesma forma, uma subida abrupta do gasóleo pode parar o País. Considero que a subida da gasolina foi uma boa decisão, mas muito mal operacionalizada. Foi um desastre”, defende José Oliveira, pesquisador do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola.
O académico e antigo director da revista Energia critica a subida repentina do preço da gasolina, “anunciada num dia, para entrar em vigor no dia a seguir”, e a forma como foram disponibilizados os cartões de débito para compensar taxistas e moto-taxistas.
Sobre como acomodar estas subidas e a retirada dos subsídios aos combustíveis num contexto desafiador para a economia nacional, José Oliveira mantém-se na defesa do gradualismo, uma posição que mantém desde que o tema saltou para o debate público.
“É preciso ter muito cuidado…Considero que é importante reduzir os subsídios, mas isso deve ser feito passo-a-passo. Por exemplo, se formos subindo o preço do gasóleo de seis em seis meses, com aumentos parciais de 10-15% (no máximo), a economia é capaz de absorver esses impactos sem provocar uma grande subida da taxa de inflação”, acredita Oliveira.
O especialista considera ainda que “a situação financeira do País é muito má” e que compensar os agentes económicos com dinheiro, via sistema multicaixa, pode ser insustentável e “correr mal”.
Outra questão importante na análise ao tema dos subsídios, na opinião de José Oliveira, está relacionada com o futuro da Sonangol. Actualmente, a petrolífera nacional importa (em USD) os produtos refinados para revendê-los depois no mercado interno (em kwanzas) – a diferença financeira entre as duas funções representa, na prática, o subsídio estatal aos preços dos combustíveis.
“A Sonangol não paga impostos e espera pelo final do ano fiscal para acertar contas com o Governo. Mas os subsídios aos combustíveis são mais elevados do que os impostos que a Sonangol deve pagar, ou seja, a dívida do Estado à Sonangol está a aumentar. E está a atingir proporções que colocam em causa o futuro da maior empresa do País, o que é preocupante”, alerta o investigador associado ao CEIC.
Para 2023, as estimativas em Angola apontam para níveis de despesa com subsídios de 1,82 biliões Kz, ou seja, 19,37% da despesa fiscal primária e 2,9% do PIB.
Expansão , 13/11/2023