Ainda sem efeito acordo de portabilidade de pensões entre angolanos que trabalharam em Portugal e os portugueses que o fizeram em Angola

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O acordo de portabilidade de pensões entre os cidadãos angolanos que trabalharam em Portugal e os portugueses que o fizeram em Angola continua a marcar passo. Governo tinha prometido solução para janeiro e garante que está “em fase final de operacionalização”.

Há duas décadas que Portugal e Angola discutem a portabilidade das pensões, ou seja, o direito a receber a pensão no país de origem, quando se trabalhou no outro.

O acordo, o segundo assinado em 20 anos e que o Governo esperava ter no terreno em janeiro de 2024, permitiria que 96 mil trabalhadores expatriados transportassem os direitos de proteção e segurança social para o país de origem. O anúncio foi feito pelo Governo, em maio do ano passado e concluía, “no plano político, um processo iniciado 20 anos antes”, mas voltou a derrapar.

O “Compromisso de Benguela” foi assinado há quase um ano, e sustenta um acordo que permite aos trabalhadores dos dois países ter a reforma reconhecida e calculada com os descontos que fizeram em Portugal e Angola. O entendimento, que deveria entrar em vigor em janeiro, “encontra-se em fase final de operacionalização”, garante ao Expresso fonte do gabinete da Ministra do Trabalho.

O gabinete da ministra acrescenta que “os organismos da Segurança Social dos dois países prosseguiram o trabalho técnico conjunto, que culminou na visita oficial a Portugal, de 12 a 15 de dezembro de 2023, de uma delegação presidida pelo Secretário de Estado do Trabalho e Segurança Social de Angola”.

A reunião permitiu afinar o acordo administrativo, que vai colocar no terreno a Convenção sobre a Segurança Social entre Portugal e Angola.

O Secretário de Estado para o Trabalho e Segurança Social de Angola, Pedro Filipe e o homólogo português, Gabriel Bastos, assumiram que a reunião teve “por meta a criação de condições para a efetivação, a breve prazo, do instrumento de coordenação entre os sistemas de segurança social de ambos os países”. Não adiantaram prazos e, desde então, nada mais foi feito.

O “Compromisso de Benguela” substituiu a convenção assinada em 2003, na mesma província, pelos dois países, que nunca entrou em vigor. Tal como o compromisso, assinado na reunião da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em maio de 2023.

O avanço do entendimento está dependente das autoridades angolanas, para permitir que os trabalhadores dos dois países possam ter acesso à reforma no fim da carreira contributiva, feita em Portugal ou Angola.

Tal como estava reconhecido na convenção de 2003, prevê-se que os trabalhadores dos dois países possam ter acesso aos direitos sociais e laborais, nomeadamente a reforma, no fim da carreira contributiva de 35 anos.

O entendimento de maio, que ainda precisa de ser concluído, foi anunciado pela Ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, durante a reunião dos ministros do Trabalho da Comunidade de Países de Língua Portuguesa.

Em dezembro, Teresa Rodrigues Dias, ministra da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social de Angola, sublinhava, em declarações à rádio nacional daquele país, a necessidade de “cautela quanto a prazos”. A governante angolana admitiu ainda que “o entendimento está longe de ver a luz do dia, apesar do acordo de princípio”.

Angola criou um grupo de trabalho, para avaliar o número de trabalhadores envolvidos e, apesar da “cautela”, a ministra assumiu que tudo estaria “feito em janeiro, incluindo os dados técnicos para implementação da portabilidade prestações sociais”.

Tal não ocorreu e a ministra angolana apontou “limitações” para o pagamento ser feito através de instituições bancárias, “porque Portugal tem outra realidade”.

Já esta semana, o Expresso contactou o Ministério da Segurança Social de Angola, sem sucesso.

76 MIL PORTUGUESES COM CARREIRA EM ANGOLA

Quando o acordo estiver implementado, os trabalhadores portugueses poderão reformar-se em Portugal com os direitos dos anos trabalhados em Angola e os contribuintes angolanos poderão aposentar-se em Angola, com o correspondente direito dos anos trabalhados em Portugal.

Ou seja, garantir o direito a transportar consigo os seus direitos de proteção e segurança social, quando regressam aos países de origem.

Este acordo irá abranger todos os trabalhadores que descontaram para a Segurança Social, quer em Portugal quer em Angola, sendo que todas as contribuições feitas antes de entrada em vigor da futura lei, quando existir, terão efeitos no cálculo das pensões.

Dados do Ministério do Trabalho apontam para a existência de 26 mil trabalhadores angolanos a descontarem para a Segurança Social. Do lado angolano serão 76 mil os portugueses com carreira contributiva a trabalhar lá.

O acordo é semelhante ao entendimento entre Portugal e Brasil, que dura há 30 anos, em que o tempo de trabalho é contabilizado para efeitos de aposentação no país de origem, apesar de os descontos terem ocorrido no país onde os trabalhadores estiveram expatriados.

Expresso, 02/07/2024