A Infrasat foi objecto de uma flagrante privatização sem concurso público, em 2017, por 60 milhões de kwanzas (na altura equivalentes a 350 mil dólares). Segundo o site Maka Angola, a empresa, privatizada a favor de interesses e do universo empresarial do MPLA, custou mais de 134 milhões de dólares ao Estado.
Esse valor, adianta a fonte, resulta do investimento inicial (2008-2011) no valor de 102,8 milhões dólares para a melhoria da infra-estrutura de comunicação do país, pagos à Cognito, uma empresa israelita do grupo LR, e mais 31,5 milhões de dólares de património entregue no âmbito da privatização, segundo avaliação interna de 1 de Agosto de 2018. Desse património constam as estações terrestres da Funda e Talatona, vários edifícios, terrenos e equipamentos.
Os interesses e o universo empresarial do MPLA, escreve o Maka Angola, são um mundo misterioso e opaco e, quando se fala da grande corrupção em Angola, há sempre meia dúzia de nomes que parecem representar toda a grande corrupção do país. Porém, a principal sociedade anónima dos esquemas a que a justiça dedica toda a sua omissão é o MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola, o único partido que governa Angola desde a independência.
Em 1999, a Assembleia Nacional deu início à transferência aberta e oficial de 250 milhões de dólares, parcelados em dez anos, para a Fundação Sagrada Esperança, o segundo braço empresarial do MPLA, mas oficialmente designada como instituição de utilidade pública.
O objectivo desta transferência era a criação de empresas sob a alçada do MPLA. No seu auge, a primeira holding do partido no poder, a GEFI, chegou a controlar mais de 60 empresas e mereceu detalhada investigação do Maka Angola em “MPLA: Sociedade Anónima”.
O responsável pelos negócios e investimentos da Fundação Sagrada Esperança, através de uma série de empresas, é Francisco Cristóvão “Chiquinho”, o mesmo que preside à GAFP – Investimentos e Participações, a principal beneficiária privada da venda, a “preço de chuva”, da Infrasat, como adiante se explicará.
Os resultados destes investimentos à custa do Estado em conglomerados empresariais são, na melhor das hipóteses, opacos. Há pouco mais de dois anos, em reunião plenária, um membro do Comité Central do MPLA, general Alberto Correia Neto, levantou o problema da falta de prestação de contas por parte deste partido, referindo-se aos seus défices orçamentais crónicos. Conforme ficou registado, a sua intervenção causou séria irritação ao “eterno” patrão da GEFI e membro do Bureau Político: Mário António. “O sistema de quotização não funciona, os militantes de base do MPLA já passam fome.
O orçamento deste ano, aprovado em Fevereiro, é deficitário porque recebemos menos dinheiro do Estado, com a perda de assentos. Das empresas criadas para apoiarem financeiramente o partido não sabemos nada. É uma questão séria”, lamenta um veterano da direcção do MPLA.
Segundo este político, que prefere o anonimato, “a prestação de contas das empresas do MPLA é um ‘segredo de Estado’ a que nem os membros do Bureau Político têm acesso. Só uns poucos sabem sobre a gestão dessas empresas e o destino dos fundos”. Quem são os beneficiários da privatização da Infrasat?
O referido despacho presidencial determinou a seguinte estrutura accionista para a Infrasat Telecomunicações, S.A. (Sociedade Anónima): Angola Telecom (40%), GAFP – Investimentos e Participações (30%), Lello S.A. (20%), MACGRA – Importação e Exportação (5%) e Funcionários da Infrasat (5%).
A principal accionista privada, a GAFP, foi criada a 9 de Janeiro de 2016. Pertence ao conglomerado de empresas sob controlo da Fundação Sagrada Esperança, do MPLA, e tem como seu principal testa-de-ferro Francisco da Silva Cristóvão “Chiquinho”. Por sua vez, a Lello S.A. é uma empresa livreira criada em 1968 pela família com o mesmo nome, que detinha a famosa livraria Lello, na baixa de Luanda.
Essa empresa foi adquirida, em Dezembro de 2016, por interesses representados por Rui Manuel dos Santos, o patrão da SISTEC, que passou a ser o presidente do seu Conselho de Administração (CA). Dois membros do CA da SISTEC, Mário Nelson Fernandes de Jesus Santos e Nuno Miguel Bismarque dos Santos, exercem respectivamente os cargos de presidente da Mesa da Assembleia-Geral e de administrador da Lello S.A.
A 6 de Julho de 2017, 11 dias antes de ter recebido 30 por cento do capital da Infrasat, a Lello alterou o seu pacto social, de venda de livros e papelaria, para ter “participação no capital social de outras sociedades”.
A livraria fechou, a Lello deixou de vender livros e passou ao negócio de gestão comercial de satélites. Como consta do website da empresa (um website sem informações minimamente desenvolvidas ou esclarecedoras), “um investidor angolano, consciente do valor da marca ‘Lello’, fez uma oferta para compra da marca e decidiu relançar as empresas, Lello, SA. e pretende investindo em sectores que conhece bem e onde se sente bastante confortável. …
Nas comunicações e em IT.” (sic) Por sua vez, a MACGRA – Importação e Transportes é uma empresa criada em 1996, com uma estrutura accionista então pontificada pela falecida veterana do Bureau Político do MPLA, Maria Mambo Café. Um antigo membro recorda que essa empresa, “fazia parte do sistema criado para prestação de apoio financeiro ao MPLA, mas era inoperante e nem sequer tinha funcionários”.
A 13 de Junho de 2017, uma semana antes do decreto presidencial de privatização da Infrasat, a MACGRA alterou o seu pacto social para incluir o negócio de telecomunicações no seu objecto social. Antes, a MACGRA dedicava-se apenas “à importação, transportes, fornecimento e montagem de equipamentos, assistência técnica e prestação de serviços às estruturas aeroportuárias”.
Maka Angola, 18/01/2023