Cirurgias vaginais têm aumentado, mas porquê?

Imagem: DR

Hoje em dia, as pessoas tornaram-se “mais livres nas escolhas sobre o corpo”, mas ao mesmo tempo o mundo da indústria estética torna-se “numa espécie de prisão da autoestima”. Quem o diz é a psicóloga Ana Paulino, mostrando-se preocupada com o nível de saúde mental das pessoas que fazem as cirurgias vaginais sem recomendação médica.

A crescente procura de cirurgias vaginais (labioplastias) por adolescentes e mulheres jovens pode estar relacionada com pressão dos companheiro(a)s, redes sociais e filmes pornográficos, afirmaram à Lusa psicólogos, que defendem um acompanhamento antes destes procedimentos.

Em entrevista à Lusa, a psicóloga Ana Paulino, que trabalha na área da dor, admitiu estar preocupada com a saúde mental das raparigas e adolescentes que se sujeitam a labioplastias vaginais apenas por razões estéticas.

A psicóloga acredita que as redes sociais, a pornografia de fácil acesso e a explosão, nos últimos anos, de clínicas de estética e dermatologia a fazer este tipo de cirurgias são as principais causas do aumento da procura.

“Prisão da autoestima”

“Preocupa-me, a nível de saúde mental, saber o que está por detrás desta decisão e desta escolha. Também me preocupa a possível desinformação, esta possível influência dos media e este tipo de clínicas de levar a pessoa com autoestima baixa a acreditar que o corpo não está como deveria estar”, sustentou.

A psicóloga observou o paradoxo de vivermos tempos em que as pessoas se tornaram “mais livres nas escolhas sobre o corpo”, mas ao mesmo tempo o mundo da indústria estética torna-se “numa espécie de prisão da autoestima”.

A psicóloga alertou ainda para os “riscos emocionais associados” a estas intervenções.

“Antes de avançarmos para uma cirurgia deste tipo, seria prudente e sensato avaliar se esta pessoa está a par da imensa e natural diversidade de aspetos estéticos de vulvas ao nível das cores, tamanhos, formas, pilosidade e afins”, alertou a psicóloga.

Ana Paulino defendeu que este tipo de procedimentos deve sempre ser feito em consciência e de forma “informada, confortável, consentida” em linha com as “necessidades, desejos, valores ou sentimentos de quem as procura”.

Também para a psicóloga e docente na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto Raquel Barbosa estas cirurgias muitas vezes podem estar a esconder problemas de baixa autoestima e problemas mais profundos de falta de amor-próprio das jovens mulheres e adolescentes.

Raquel Barbosa defendeu que em todas as clínicas que realizam estas cirurgias deveria haver um acompanhamento da saúde mental e uma avaliação psicológica às jovens que querem avançar com esta intervenção para sinalizar se há problemas mentais.

Depois da cirurgia, o que acontece?

A psicóloga e investigadora da Universidade do Porto referiu dados da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica, que fez uma revisão de vários estudos na área destas cirurgias, concluindo que, de todas as mulheres que procuram este tipo de cirurgias, menos de metade ficam satisfeitas com o resultado.

No fundo, disse a psicóloga, é a confirmação de que há “questões de saúde mental, de autoestima e de autoimagem que não se resolvem com uma cirurgia estética”.

A maior facilidade de acesso a estas cirurgias, conjugada com as redes sociais, aumentam a “disseminação destes ideais de beleza, muitas vezes completamente idealistas e manipulados”, observou a psicóloga Raquel Barbosa.

“A autoestima vem de casa. A autoestima vem do berço”, disse a psicóloga, referindo que as crianças têm ser valorizadas enquanto pessoas, independentemente da forma do corpo.

SIC Notícias, 17/06/2024