Petrolífera privada angolana vai gastar mais de mil milhões de USD na compra das participações de nove multinacionais nos blocos 14, 14K, 18, 27, 31 e 32 e 17/06. Somoil diz que mostrou a lista de accionistas e garante que o dinheiro vem de fundos próprios e de crédito junto da banca internacional.
Dúvidas sobre quem são os últimos beneficiários e a origem dos fundos da Somoil levaram os parceiros dos Blocos 18 e 31 Azule Energy e Equinor a solicitar esclarecimentos à petrolífera privada angolana, passando a pente fino as suas contas e operações.
Fundada por altos cargos da Sonangol há mais de vinte anos, a petrolífera angolana tem vindo a ganhar espaço no sector petrolífero nacional através de investimentos avultados de várias centenas de milhões de dólares, como a compra de três participações da Sonangol em poços petrolíferos onde irá ter como parceiras estas duas petrolíferas estrangeiras caso o negócio de 345 milhões USD seja concluído.
Em causa está o direito que estas duas petrolíferas estrangeiras têm em relação à entrada de novos sócios nestes dois blocos, depois de a Sonangol já ter anunciado como fará os negócios. O bloco 18, no qual a Sonangol vai ceder 8,28% dos seus 16,28% à parceria entre a Somoil e a britânica Sirius, e onde já estavam como associadas a Sonangol Sinopec International (SSI) e a BP, agora denominada Azule Energy depois da petrolífera britânica ter juntado os seus activos os italianos da Eni.
Já no bloco 31, a Sonangol acordou a venda de 10,00% da sua participação à Somoil e Sírius, que a concretizar-se terá depois como associados a BP, a SSI e a norueguesa Equinor. Mas as últimas movimentações da Somoil no mercado petrolífero angolano vão muito além do “farm out” da Sonangol pelo que são mais as dúvidas que certezas sobre quem tem participação nesta sociedade anónima, ainda que na última Grande Entrevista ao Expansão o actual PCA da petrolífera, Edson dos Santos, tenha revelado apenas três dos 11 accionistas, nomeadamente Ana Nunes (antigo quadro da Sonangol), Salgado e Costa (antigo quadro da Sonangol) e Almeida e Sousa (antigo chefe de divisão de geofísica da Sonangol e bloco chairman). Entretanto, a Somoil anunciou que vai à bolsa em 2024, pelo que terá de informar sobre quem são os accionistas.
De acordo com fontes do Expansão, o facto de num curto espaço de tempo a Somoil ter sido anunciada como candidata à compra de 10 participações das petrolíferas Galp, PTTEP, INPEX, TotalEnergies e Sonangol, que estão a motizar os seus interesses, ligou os sinais de alerta, especialmente na Noruega onde a Equinor é uma empresa cotada em bolsa e está obrigada a saber com quem tem parcerias. Por isso exigiu à Somoil informação sobre a proveniência dos fundos e quem são os últimos beneficiários da empresa.
Se na Noruega soaram os alarmes, o mesmo deverá ter acontecido em Portugal, segundo confidenciaram ao Expansão alguns analistas, quando em Fevereiro a Galp anunciou a venda das suas participações nos blocos 14, 14k e 32 à Somoil, num negócio avaliado em 830 milhões USD (655 milhões quando estiverem concluídas as negociações e 175 milhões em prestações em 2024 e 2025). Ainda assim, neste negócio a petrolífera portuguesa teve como consultora financeira a BofA Securities (Bank of America), o que confere maior credibilidade à operação.
Se no caso da Galp (em que a Sonangol até tem uma participação indirecta) se sabem os valores em causa por imposições da bolsa portuguesa que obriga a transparência, o mesmo já não acontece noutras operações. A francesa TotalEnergies que até está listada na bolsa de Paris e a japonesa IMPEX não revelaram quanto vão encaixar com a venda das participações de 20% e 10% à Somoil nos Blocos 14 e 14K operados pela Chevron.
Também no negócio dos Blocos 18 e 31 apenas se sabe que irá envolver 345 milhões USD porque a petrolífera júnior britânica Sirius revelou esse valor ao mercado, sem adiantar quanto caberá pagar à Somoil no negócio onde ficarão sócios.
Além destes investimentos de mais de 1.000 milhões de dólares, a Somoil entrou recentemente em dois blocos onshore licitados pela ANPG. Tudo isto ligou o sinal de alerta de alguns parceiros internacionais que estão listados em bolsa e que são obrigados a um maior escrutínio sobre os seus investimentos e parceiros. É o caso do parceiro noruegês, a Equinor (67% de capitais públicos), que em 2016 se chamava Statoil e que anunciou naquele ano ter discutido com as autoridades policiais daquele país o pagamento de 50 milhões USD para a criação de um centro de pesquisa em Angola. Na altura, a Statoil afirmou que os pagamentos eram legítimos e as autoridades acabaram por não avançar com uma investigação, mas isto demonstra as exigências em termos de transparência a que estão sujeitas estas empresas nos seus países.
Questionado pelo Expansão sobre estas exigências da Equinor e da Azule Energy, o PCA da Somoil, Edson dos Santos, confirma que as petrolíferas estiverem na sede da petrolífera privada angolana ao abrigo da due diligence obrigatória nestes prcessos e que de facto a Equinor fez “muitas perguntas e pediu para ver toda a informação sobre activos e origem fundos da empresa”. E acrescentou: “mostrámos a lista dos accionistas e informações que lhes permitirá averiguar tudo sobre a Somoil”, num processo, sublinha, muito semelhante ao que aconteceu com a Galp (e o Bank of America) e com a TotalEnergies. O PCA da Somoil garante que os fundos utilizados nestas operações resultam de fundos próprios e de financiamento bancário internacional.
Expansão , 27/03/2023