Quem poderia imaginar que Angola se tornaria um pária financeiro: falida, e tão falida que até mesmo os mercados financeiros globais veem o país como um caso perdido. Em termos empresariais, se o país fosse visto como uma empresa, receberia rapidamente um status de falência.
Esta é a nova realidade? O transactionalismo saiu de controle. Detentores de dívida e instituições financeiras estão abandonando o barco e tentando recuperar qualquer dívida pendente que possa ser salva. Como chegamos a isso?
O Dilema de Angola
O Financial Times (Londres) expressou o status atual de Angola da seguinte forma:
“Você é um credor, entre um grupo de credores, que, em algum momento, concedeu um empréstimo sindicalizado de propósito misterioso e quantia desconhecida à nação africana rica em petróleo, mas atualmente muito falida, Angola. Em algum momento, você e todos os outros credores foram submetidos a sanções internacionais — opa! — e o empréstimo implodiu de alguma forma. Recentemente, você acusou Angola de inadimplência soberana sobre o fiasco, em uma arbitragem apresentada… em algum lugar, mas não nos registros públicos do Banco Mundial ou da ONU. Quem é você? Sabemos que você está por aí, porque Angola recentemente usou um prospecto para emissão de quase US$ 2 bilhões em títulos para enterrar o detalhe bastante infeliz de que alguém acusou o país de inadimplência.”
O Cenário Angolano
Desde sua independência em novembro de 1975, Angola tem lutado com diversos extremos: uma guerra civil interna, uma paz negociada em um país abençoado com recursos naturais e beleza, e uma dicotomia que apresenta extrema pobreza e uma imensa riqueza concentrada na liderança do país — construída sobre a indústria do petróleo e gás. Qual é o legado?
O histórico de Angola não é dos mais invejáveis: para a maioria dos angolanos, a expectativa de vida está entre as mais baixas do mundo, e a mortalidade infantil está entre as mais altas. US$ 30 bilhões de dinheiro público estão sem prestação de contas.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) relata que Angola tem um dos maiores níveis de dívida da África Subsaariana: 73,7% do PIB em 2023.
A dívida do setor público, que inclui a Sonangol e a TAAG (companhia aérea nacional), será de US$ 52 bilhões em 2025; em 2024 era de US$ 59 bilhões e em 2023 era de US$ 74 bilhões.
Angola espera manter a produção de petróleo em pelo menos 1,1 milhão de barris por dia (MMBOPD) em 2025, uma expectativa consideravelmente baixa, visto que sua produção foi de 2 MMBOPD há 17 anos.
Em 2022, mais de 15,1 milhões de pessoas no sudoeste da África viviam na extrema pobreza, com um limiar de pobreza de US$ 1,90 por dia. O número de pobres em Angola segue uma tendência crescente. Em 2016, havia cerca de 10 milhões de angolanos na extrema pobreza. Em 2026, esse número subirá para 16,3 milhões.
A Conexão Chinesa
Embora a China não tenha sido diretamente mencionada na atual crise, sua influência paira sobre Angola.
O relacionamento financeiro de longa data entre Angola e China baseia-se em uma equação simples: reembolsar sua crescente dívida chinesa com petróleo. Angola deve US$ 17 bilhões aos credores chineses, e os empréstimos chineses constituem cerca de 40% de sua dívida total. A S&P, agência internacional de classificação de risco de crédito, estima que os pagamentos da dívida consomem quase metade do orçamento nacional de Angola.
Recentemente, Vera Daves de Sousa, Ministra das Finanças de Angola, disse ao Financial Times que Angola concordou com seu maior credor, o Banco de Desenvolvimento da China, em liberar dinheiro retido como garantia para seus empréstimos bilionários. Ela afirmou que o fundo de garantia liberará entre US$ 150 e US$ 200 milhões por mês para cobrir essas obrigações. O plano não inclui uma reestruturação da dívida, mas visa quitá-la rapidamente para evitar o calote.
A Solução Argentina: Um Pesadelo Angolano?
Entre 1860 e 1930, a Argentina tornou-se uma potência econômica e um dos dez países mais ricos do mundo per capita — à frente da França, Alemanha e Itália.
Nos anos 1930, ocorreram ciclos de expansão e colapso devido a gastos governamentais insustentáveis e dependência excessiva de exportações de commodities como carne bovina e trigo. As décadas de 1970 e 1980 viram crescimento estagnado, dívida crescente, queda nos rendimentos reais e hiperinflação.
Em 2001, uma crise econômica devastadora ocorreu quando a Argentina não conseguiu manter a paridade do peso com o dólar dos EUA e ficou impossibilitada de pagar uma dívida de US$ 95 bilhões.
Angola estará destinada ao mesmo destino? Com credores internacionais e instituições multilaterais como a China, pouca clemência pode ser esperada. Um longo leilão de dívida por um período indeterminado?
Gerard Kreeft é consultor de transição energética e autor do livro The 10 Commandments of the Energy Transition, disponível em: https://books.friesenpress.com/store/title/119734000211674846.
Africa Oil Gas Report, 02/05/2025